15.12.11

O mais novo poeta antigo do Brasil

Um dos personagens mais interessantes criados por Woody Allen está no filme “Vicky Christina Barcelona”. Trata-se do pai do artista vivido por Javier Bardem: homem que, segundo seu filho, é capaz de “escrever os versos de amor mais belos da Terra”, mas que jamais os publicaria em vida, por acreditar que “o mundo é incapaz de compreendê-los”.


Parece que tal poeta existe, é pernambucano e padre. Chama-se Daniel Lima, tem 95 anos e foi agraciado há uma semana com o prêmio do Concurso Literário da Biblioteca Nacional.

Levou o valor de R$ 12,5 mil quase por acidente, uma vez que a obra foi inscrita no concurso por amigos – Daniel não intencionava publicações em vida e até mesmo foi contra, quando soube do que lhe foi feito à revelia. Acabou por superar mestres como Ferreira Gullar e Affonso Romano de Sant’Anna.

Perfis publicados nos jornais dão conta de uma timidez doentia como a principal razão para que Daniel tenha atravessado quase um século sem permitir que nós pudéssemos conhecê-lo.

Ao brilhante repórter Fabio Victor, da “Folha de S.Paulo”, Daniel resumiu sua condição atual de poeta hospitalizado, impedido de receber em mãos o prêmio que lhe deram: “Adoeci de Daniel. O mundo é muito importante, eu fico meio desorientado. Para me enquadrar nele eu tenho de sofrer e adoeço”. Missão quase tão improvável para nossos dias quanto ler poesia.

No país campeão mundial em analfabetismo funcional, poemas são ensinados como esfinges, enigmas para respostas longínquas, quando deveriam ser estopins para a detonação das verdades que guardamos em nós e de nós – e que eles sabem compreender e revelar.

Leia, por exemplo, o trecho de “Casa Revisitada”, do novo poeta antigo de Pernambuco, e veja se é possível não se identificar com ele.

“Na frente, um portão velho que rangia
como se dissesse coisas tristes a quem por ela passava.
E dentro da casa onde nasci
um corredor sem fim corria não sei para onde
E nem sei por que corria
o corredor sem fim da casa onde nasci
nem sei para onde.”

“Poemas”, de Daniel Lima, foi editado pela Cepe (R$ 45). Arrisque-se.

Um comentário:

Anônimo disse...



Não imagino o mundo sem poesia. É o que move a alma. ( passeando pelo seu blog e amando tudo )

@DMariazinha