17.1.13

E a poesia vai deixar de ser 'inútil'





A Inglaterra, você sabe, é o maior produtor mundial de estudos de universidades britânicas – aquelas descobertas tão surpreendentes quanto duvidosas a respeito de certa coisa provocar um dado efeito. Agora, descobriram que a poesia pode ser útil.

Sim, logo ela, descrita pelo curitibano Paulo Leminski (1944-1989) como um dos “inutensílios” do mundo e “parte das coisas que não precisam de um porquê”, como a amizade e o orgasmo. Mas, se certas amizades são por interesse e certos orgasmos são contados em calorias queimadas, à poesia ainda não haviam agregado nenhum outro valor ou função.

Foi assim até a última terça, quando a Universidade de Liverpool submeteu 30 voluntários a clássicos da poesia de língua inglesa como Shakespeare, John Donne (1572-1631) e o moderníssimo Philip Larkin (1922-1985), jamais editado no Brasil. Os estudiosos descobriram que os cérebros dos estudados disparavam quando diante de palavras incomuns ou frases com uma estrutura semântica complexa. Por outro lado, quando lida uma versão mais coloquial do texto, o cérebro não trocava a marcha. Os estudos em andamento devem levar a tratamentos de pessoas com problemas psicológicos, asilos, prisões e – quem diria! – escolas. Espera-se que a poesia aja até melhor que livros de autoajuda. Uou.

Nada disso soa novo para o leitor de poesia: um bom poema tem um efeito imediato, devastador, químico, e permanece no cérebro para ser decifrado pelas entranhas da experiência do leitor. A cada pessoa, os significados variam, e os versos, pelas palavras escolhidas e por sua musicalidade, acabam por ser uma chave que “destranca” algo em nós. O que parece ser “sobre nada” se materializa e lança luz sobre aquilo que cotidianamente nunca é dito.

Foi o alemão Schiller – em 1795! – quem disse que nossa era é regida pela deusa Utilidade, “à qual todos os poderes devem servir e todos talentos devem jurar fidelidade”. Talvez a poesia enfim cumpra o destino de tudo que se move: existir para certa finalidade a mais. Mas há um lado bom:

O céu sublime tomou seu posto, apoiando-se no muro.
É como uma oração ao vazio.
E o vazio volta seu rosto a nós
e sussurra:
Não sou vazio, sou aberto. 

(Tomas Tranströmer, poeta sueco vencedor do Nobel de Literatura em 2011 em “Vermeer” (2004). Tradução minha do inglês.)

Um comentário:

Anônimo disse...

Amém! Talvez o mundo ainda tenha jeito! \o/