31.5.12

Carta a um jovem bailarino de 13 anos



These are private words addressed to you in public
T.S. Eliot



Enzo Frizzo Paulino Batlarejo, 13 anos, mora em São Paulo. Como qualquer garoto de sua idade, gosta de usar computador, entrar nas redes sociais e se dedica às atividades extracurriculares que sua condição de classe média lhe permite. No caso de Enzo, o balé clássico.

Quando seu tradicional colégio católico descobriu, a vida de Enzo virou um inferno. Foi chamado de “gay” e “viado”, surrado e até “proibido” de usar o banheiro masculino.

Sua mãe, que era professora na instituição, procurou a coordenação. Segundo ela, ouviu que ele deveria se acostumar, porque, afinal, dançava balé. “Eu me sentia a escória. E eu não sou gay”, disse o menino em entrevista a Felipe Oda, de “O Estado de S.Paulo”.

A história é idêntica ao que vivi no colégio carioca em que estudava enquanto dançava clássico. Fui personagem de matérias em “O Globo” e “Jornal do Brasil” nos anos 1990 por isso, mas jornal algum registrou o que minha vida escolar virou depois que meus colegas leram na imprensa que eu calçava sapatilhas.

Como eu, Enzo descobriu que o preconceito é um revólver disparado por um cego. A torpe aversão a gays faz as pessoas repudiarem até quem pratica algo que não identificam como sendo “viril”. Aos olhos do preconceituoso, nem a realidade interessa: mais interessante é o prazer em agredir o que ele quer longe de si.

Enfim, ser hétero não salvou Enzo de sofrer, como não salvou a mim. Ainda tive um professor de física que, ao me ver chorar na classe, disse-me: “Você acha que eles algum dia vão parar? Você quis fazer isso. Agora aguente.”

Ele e sua pedagogia medíocre pretendiam que eu desistisse. Só que ali entendi que o mundo pode ser hostil com quem quebra sua monotonia e até a Justiça que deveria defender os mais fracos se omite – no caso, a supervisão da escola. Nessas horas, é preciso perseverança para continuar. Lamentavelmente, respeito às vezes ainda se torna um esporte de contato.

São palavras confidenciais que envio a você em público, Enzo. Só deixei o balé quando percebi que não tinha talento: sem crise, sem traumas, satisfeito por ter aproveitado o que queria. Que você aproveite tudo, Enzo. E lembre-se: tudo o que as pessoas disserem falará mais delas e de seus problemas do que de você. Logo, não perca tempo ouvindo. Não vai importar.

10 comentários:

Sergio disse...

Que que o moleque vai inventar de fazer BALÉ tambem? Tem que mais é que levar umas surras

Priscila disse...

Oi, Márvio.
Muito bacana ler a sua história.
É incrível saber que pessoas que fazem parte da estrutura pedagógica da própria escola podem ser coniventes com esse tipo de agressão mesmo nos dias de hoje.
Espero que o Enzo leia sua mensagem solidária.

Na Transversal do Tempo - Acho que o amor é a ausência de engarrafamento disse...

Sérgio, você é um imbecil.. sem mais.

.Marcelly disse...

Márvio,

Você nem sabe,mas, o pouco que eu sei de sua vida escolar, através do Sergio, contei para um aluno meu. Durante uma conversa informal, o rapaz chamado Allan, aluno do ensino médio, me contou que fazia balé. Perguntei que se ele sofria ou sofreu bullying por conta disso, ele disse que sim, mas que os amigos já se acostumaram à atividade dele e ele às zoações.
Falei de você. Por isso. Porque ele precisava saber que não foi o primeiro a passar por isso. Ele ficou mais aliviado. Contudo, mantém o discurso "fiz para mostrar para os outros..."..Enfim, sem nexo falar isso. Mas, adolescentes norteiam demais sua vida pelos outros. Fazem o que os demais querem para serem aceitos, ou não fazem o que os demais querem a fim de se mostrar superior...Sempre isso...Sempre essa babaquice de se nortear pelo outro e dar uma importância demasiada à opinião alheia...
E, a questão gay...ainda que fosse. O que teria a ver? Qual o problema das pessoas serem gays? Eu não entendo isso e meus alunos não me entendem...Chegam a dizer, sobre os gays, que "aceitam a pessoa, mas não o que ela faz...". Como assim, se preocupar com o que o outro deixa ou não de fazer? Olha, eu tô com esperança no livro da Clara Averbuck, o Eu quero ser eu...Porque, eu, enquanto professora de Filosofia do Ensino Médio, sinto-me uma fracassada por não conseguir fazer com que meus alunos entendam quão grosseiros e preconceituosos eles são. Isso me faz sofrer e eu precisava desabafar. Obrigada, uma sessão de terapia a menos...
E usarei seu texto em sala de aula, com as devidas referências à publicação.

Talvez Enzo não lerá, infelizmente. Mas espero que as pessoas que falaram isso tenham consciência que isto não é apenas uma falta de educação. Eu vejo, sinceramente, embora não tenha formação para diagnóstico, notas características de psicopatia.

.Marcelly disse...

Sergio,

Sinceramente, o que faz comentar algo o qual você sabe que será hostilizado. Você está carente?
Procure um analista e conte isso. Beijo

Allan disse...

Eu sou apaixonado por balé. Minha vida de "bailarino" é regida pela frase: "Balé é um vício, quanto mais eu danço mais eu quero dançar." (Tara Webster - Dance Academy).

Celina Araujo disse...

Lindo esse texto, de uma sensibilidade incrível. Obrigada e parabéns!

.Marcelly disse...

Orgulho do meu aluno <3

Unknown disse...

Eu te zoado com teu canto lirico, mas era inveja e voce sabia! heheh : ) grande abraco, brother!

Unknown disse...

apaga ai o de cima, Marvio. Eu dizia... "Eu te zoava com teu canto lirico, mas era inveja e vc sabia!" hehe grande abraco, brother!