7.6.13

Sobre panteras, presas e perdas



É uma pantera. Olha-me fixamente, a pele escura manchada de pintas inda mais escuras, e seu rabo desenha ondas hipnóticas no ar. Não sei qual de nós é a vítima da hipnose, dado que nos olhamos fixamente e pouco nos mexemos mais do que o mecanismo de respiração mamífero exige. 

Não é de sempre que percebo seus passos discretos a seguir-me. Sutil, ela se esgueira pelas paredes da cidade, pelas escadarias dos edifícios, a uma distância segura. Ocorreu-lhe um deslize e a percebi. Desde então que ouço seu murmúrio, inseparável e equidistante, como trilha do caminho que eu escolho e ela segue.

Agora seus membros robustos, seu porte elegante e seu tronco sedutor e feminino apontam para mim como uma seta de intenções. Alguma predação era de se esperar em meio aos minutos em que nós nos encaramos, rostos empedrados, concedendo um ao outro a expressão que reservávamos quando mutuamente nos tínhamos em mente – e nada mais.

E dá-me agora a impressão de que a pantera parece maior e mais possante quando eu lhe dou as costas. Diante de mim, seu tamanho se reduz, seu garrote se emparelha à altura de minhas coxas, e talvez seja eu quem provoque mais medo nela, no prólogo daquele duelo cujo gongo iniciador jamais soa.

E imagino que esperamos que algo ao redor de nós desperte aquela fúria - ou aquele medo - que precipita os confrontos. E assim adiamos nosso embate pré-marcado e cansados nos despedimos. Não nos odiamos o suficiente, nem nos tememos o bastante para dar um fim nisto.

Há no entanto um minuto em que me vejo apreciando o olhar e as expressões que me tragam. Como ver minha morte por vários ângulos. Usaria primeiro as garras? Cravaria onde sua mandíbula? Viria pela frente ou optaria por atacar-me de costas, tornada superior por uma covardia que a natureza não acusa por considerar legítima dos predadores? 

A pantera fica imóvel, companheira e inseparável, enquanto a fito... por meses, anos e eras. Noto que não sou eu sua presa, admito, mas sim a atenção e o tempo que inevitavelmente lhe dou.

Um comentário:

Anônimo disse...


A pantera que me sonda é a depressão. Adorei o texto. Adorava seus posts sobre a Copa do Mundo do ano passado (foi qdo comecei te seguir), não sabia q escrevia sobre outros assuntos.

Beijos


(sou a @DMariazinha)