16.5.13

Por um punhado de eternidade


O título do livro já é de um poder de atração inegável, tamanha a elegância da ironia: “Uma Breve História da Eternidade” (recém-lançada pela Editora Três Estrelas, R$ 50 em média). Para contar a trajetória da expectativa mais sedutora e jamais comprovada por nós mortais, é preciso ser não só culto, como bem humorado. Carlos Eire, professor da Universidade de Yale, reúne esses dons numa obra fantástica, que contribui para enriquecer o debate sobre a compatibilidade entre a razão e a fé nos nossos dias bipolares.

Ao narrar como a eternidade foi moldada e remoldada pela civilização ocidental, Carlos Eire maneja conceitos teológicos, filosóficos, políticos e científicos de maneira acessível, dos primórdios da religião judaica até as hipóteses mais atuais da física sobre tempo e universo.

Não é um livro com respostas: é antes a cronologia de como o Homo sapiens se fez as perguntas sobre o que é eterno e como reagia às hipóteses que as melhores imaginações sustentaram, com base no que tinham à mão. Aliás, uma das melhores características de "Uma Breve História da Eternidade" é perceber que Eire divide conosco suas dúvidas e inconformismos, sem jamais se negar à ironia disso tudo. Nessa abordagem empática, ele se aproxima muito de outra historiadora de religiões, a britânica Karen Armstrong (de "Jerusalém" e "Uma História de Deus"), embora seja mais despojado que ela. Para ambos, o ser humano tem motivos para não ser reduzir a uma máquina destinada a lidar apenas com os dados comprovados do mundo e suas apreciações estéticas – no que se resume a agenda de certezas do novo ateísmo.

Eire também nos mostra como a vida social e política foi influenciada por essa ideia que, ao longo dos séculos, se expandiu e se retraiu conforme suas versões ofereciam soluções ou revelavam dilemas atrozes. Movimentos que nos fizeram sair dos enterros dentro de igrejas e das múltiplas missas pelas almas dos mortos para chegarmos à forma da democracia laica, sem que isso tenha deixado nossa mortalidade mais "aceitável".


Carlos Eire, historiador cubano-americano de religiões


Cubano que se refugiou nos EUA, Eire também aponta os dois mundos em que a eternidadade some do horizonte, descreve como a moralidade recua nesses ambientes – tanto no materialismo totalitário do Estado, quanto na angústia do consumismo egocêntrico – e observa de forma sagaz o presente do dilema esboçado por antigos gregos: conceitos que damos como inegáveis em nossas realidades ainda são construções sociais em torno de ideias aceitas.

“A eternidade é mais fácil de se conceber do que de ser aprendida”, afirma. Assim, não se nega a recorrer aos poetas, romancistas e cineastas que expressaram o inconformismo geral com nossa finitude – sempre conforme a (des)crença em voga à época. Tudo isto enriqueceu o imaginário da espécie que, como nenhuma outra, tem consciência de que vai morrer e, por isso, resiste.

Seja essa insubordinação o principal erro do nosso DNA, seja um sentimento com que conviver, todos os sonhos da eternidade mereciam uma biografia – e esta é um primor.

2 comentários:

Anônimo disse...

Adorei o texto. Estou curiosa para ler o livro. Verifique somente que há um errinho no texto. Se ao invés de ser.

Anônimo disse...

Fiquei com vontade de ler o livro. Obrigada pela dica.

(sou sua seguidora no Twitter - @DMariazinha)