22.8.13

O dilema de Emicida




O cantor Emicida, um dos mais ativos cantores/ativistas do país, viu sua credibilidade entre as feministas arranhada, após a repercussão de “Trepadeira”.

“Trepadeira”, em resumo, é a crônica de um rancor. Usando vasto vocabulário botânico, um homem se arrepende de ter se dedicado a uma mulher que não valia a pena: nas palavras dele, ela “dá para todo mundo” e merece “uma surra de espada-de-São-Jorge”.

A dor de todo abandonado ou abandonada normalmente apresenta como sintoma a mais completa desqualificação da pessoa que abandonou. Um menosprezo, o desdém que caracteriza quem sempre quis comprar, mas acabou vendido pela paixão – e o rapaz da canção não faz outra coisa.

A moça da letra era a mulher da vida do personagem da canção – que não necessariamente é autobiográfica – e isso é descrito por todas as flores às quais ela é comparada. Mas deu ruim, "ela é rueira", "ela dá para todo mundo".

A maioria das críticas feministas abre mão da ideia de que é apenas uma canção, quase uma fala teatral de um personagem que faz um desabafo. Ficção enfim. Mas traição para elas.

Talvez Emicida tenha pagado o preço de seu engajamento pelas minorias – algo de que ninguém deve duvidar. Não é possível a esta altura tomar a canção como a saída do armário de um machista. O comportamento de Emicida sempre foi o de enfrentamento ao establishment em nome das comunidades e minorias que o aplaudem, e ele sempre se mostrou simpático à agenda progressista.

O que se questiona é: um artista tão politizado de rap – um estilo que se pauta pela autenticidade da periferia – está condenado a ser sempre real? Não há espaço para criar personagens – que sim, podem ser criticados como qualquer vilão de novela?

Talvez por ter sido tão autêntico como manda o figurino de seu estilo, Emicida deu a entender que jamais poderia se aventurar a falar de sentimentos que existem, a cantar as emoções de quem quer que seja: estava aprisionado, como artista autêntico, a ser sempre tomado em primeira pessoa e ao pé da letra.

Eu acredito que o Brasil tem direito a alguma ficção, a alguma crônica de costumes, a uma expressão de rancor de quem foi esnobado por alguém que não quis um compromisso sério – sentimento que existe até nos corações mais liberais e nas bibliografias mais extensas. E uma canção nem sempre é um discurso. Às vezes, um "Tropa de Elite" é só um filme de entretenimento, e não uma mensagem-denúncia documental fascista.

Como Emicida vai reagir à patrulha ideológica é a incógnita. Não gosto muito de hip hop, mas prefiro que ele cante "Trepadeira" em vez de se censurar. Tenho certeza de que as meninas do Bloco das Trepadeiras, da sambista carioca Maria Thalita, vão recebê-lo com mais humor e amor.

7 comentários:

Gabriel Lucas disse...

Márvio,

Uma das graças do Emicida é que desde o começo ele mistura sua postura "real" com ficção.

Em seu mixtape "Pra quem já mordeu um cachorro por comida até que eu ..." (um dos grandes álbuns da primeira década dos século XX), o MC passa ideia de ter vivido na total miséria, quando na verdade a mordida no cachorro (que ele já contou em várias entrevistas) foi algo mais lúdico, não uma batalha pela vida.

Artista que admiro muito.

Abraços,
Gabriel Lucas
http://factoide.com.br

Kaká disse...

Chico Buarque foi sabatinado quando gravou "Mulheres de Atenas". As feministas de plantão não entenderam a mensagem... e olha que o Chico é o cantor mais sensível que conheço, tendo composto belas canções do ponto de vista feminino, como se realmente fosse uma mulher.
Infelizmente, algumas coisas não mudam com o passar dos anos...

Unknown disse...

Cara, já vi tanta mulher dizendo que "fulano não é pra casar", já vi amigo levando fora pq a mulher disse que "ele não tinha condição de ter uma vida com ela"... Acho de uma babaquice tão tremenda as pessoas serem obrigadas a não se importar com o passado de seus/suas companheiras. Se as mulheres não se importam de ficar com caras que já comeram metade das pessoas que ela conhece, que bom pra ela, mas eu me reservo no direito de não querer. Ela que faça o que quiser e eu não posso discriminá-la, mas daí a ser obrigado a não me importar já é demais.

Galt disse...

Liberdade de pensamento...de expressão...frase tão batida mas até hoje as pessoas não entendem.
Não peço que concordem mas respeitem, ainda mais quando se fala de arte,o que seria do Édipo se fosse censurado?

"Não concordo com o que diz, mas defenderei até à morte o seu direito de o dizer" --> Voltaire

Anônimo disse...

"mas daí a ser obrigado a não me importar já é demais."

O velho discurso. Não discrimino (preto, viado ou mulher que dá) "mas daí a ser obrigado a não me importar já é demais."

Parabéns por ser um imbecil, rapaz que comentou aí acima.

O outro que clama pela liberdade de expressão, queria convidá-lo a conhecer uma unidade de atendimento a vítimas de violência doméstica. Claro que posso cantar sobre o que quiser, né, mesmo que meu discurso esteja incitando uma prática que mata.

Queria saber se a reação seria tão branda se o discurso fosse pró-nazismo, por exemplo. Afinal, se é apenas o eu-lírico, se temos liberdade de expressão e, pelo visto, de opressão, por que não?

Unknown disse...

blá, blá, blá... feminazista detectada!

Como sempre deturpando as idéias alheias... e sempre procurando práticas extremas para fixar o discurso alheio (nazismo e facismo no geral).

Muito baixo. Se não sabe brincar guarde o carrinho!

Roberto disse...

Serio não consigo gostar desse cara,serio ninguem nunca questionou certas rimas deles sem sentido so pra encher as linhas e acrescentar algo na música, fora a dicção que é um horror, dificuldade pra entender o que esse cidadão canta, ate que melhorou um pouco, mas o Emicida chato continua forte ali